segunda-feira, 12 de janeiro de 2009

Meu trompete.

O trompete é um dos instrumentos mais difíceis que existem.

Para começar, são sete notas e ele tem 3 pistões - a conta já não bate. Algumas dessas notas exigem que você sopre mais ou menos forte, posicionando a língua de uma maneira que a nota saia grave ou aguda, sem apertar nenhum pistão. Há um gatilho que muda ligeiramente o tom do bicho, que você usa só no Ré maior (abre um centímetro) e no bemol (abre dois centímetros). Isso tudo enquanto lê uma partitura com milhares de bolinhas, risquinhos, tracinhos, letras, números, um monte de símbolos esquizofrênicos.

Eu consigo tocar algumas coisas no trompete, desde que não ultrapasse o tempo limite de 30 minutos. Porque a partir daí, com a boca dormente e os beiços inchados como se tivesse tomado Ayuasca, o som não sai. Ou sai "ventando", como dizia o meu professor em 2003, ano em que comecei e parei com as aulas.

Faço os exercícios que ele me fez copiar no caderno de partituras, treino a escala cromática (três oitavas subindo e descendo). Mas aí toco o solinho de "Life's a beach" por uns minutos e caio matando no "Cantaloupe Island" do Herbie Hancock. Está cada vez melhor, embora eu nunca vá ter coragem de mostrar para alguém - o trompete é como esse blog.

Ontem foi um bom dia. Exercitei os beiços e gastei fôlego e cuspe por um bom tempo. Aí guardei o instrumento no estojo e saí para dar uma corrida no parque. Uma hora de corrida, suadão, paro para tomar um suco e, no balcão dos sucos, encontro um vizinho gente fina com a mulher.

- Porra, ó o cara, maior fitness.
- É, tô me cuidando. E vocês, faz tempo que tão aqui?
- Umas duas horas, mais ou menos...
- Saquei.
- ... a gente se mandou quando um filho da puta começou com uma porra de um trompete. Você ouviu?
- Eu tava correndo.
- Caralho, não dá para ficar em casa. Barulho dos infernos, parece que tão matando um cachorro.

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