segunda-feira, 19 de janeiro de 2009

F Train to Coney Island.

Eram quase 4 da tarde de um dia ensolarado e quente. Andar era insuportável, porque o calor que subia do concreto das largas calçadas de Manhattan parecia capaz de derreter a sola do tênis. Já era o quarto dia da viagem e não havia muito para fazer que não implicasse em sofrer insolações assassinas: 16 pessoas morreram de calor naquela quinzena de 2003.

Decidi pegar o metrô para Coney Island, famosa praia com parque de diversões que pertencia à cidade do Brooklyn (só virou um bairro de Nova York em 1898). A paisagem se transforma rápido: num instante você está no centro financeiro da cidade mais importante do mundo. Quinze minutos depois está passando por um bairro definitivamente pobre. Mais outros quinze minutos e dá para pensar que se está chegando na rodoviária do Tietê em São Paulo.

A mudança no visual do interior do metrô também é perceptível. Tanto quanto o suor que a essas alturas me empapava as costas debaixo da mochila, onde eu carregava câmera, guias, livro, passaporte, carteira e tudo que não deveria estar carregando para Coney Island. A população do trem a essas alturas, 60 minutos depois de embarcar em Manhattan era composta por 25% de velhinhos desconfiados, 35% de mendigos, 40% de negões ameaçadores com roupas de basquete e o restante por latinos com camisa xadrez que poderiam ser figurantes no Warriors.

Mais de uma hora de viagem, eu vi no meu Citizen de colecionador. Levantei a cabeça e vi um outro cara também olhando para o meu relógio. É mania de brasileiro, chegar num lugar e achar que só o Brasil é uma merda. Enquanto eu tentava disfarçar e esconder o pulso, o cara se levantou e cutucou um outro. Os dois caminharam na minha direção.

Foram os únicos três segundos em toda aquela viagem que eu esqueci do calor.

O negão parou do meu lado. Fez a pergunta clássica de ladrão que vai roubar relógio:
- Yo, what time is it?

Eu, com voz de quem tinha acabado de inalar um balão de hélio:
- Cinco e quinze...

Ele deu um berro:
- NO!!!!!!!!!!!!!!

E, em perfeita sincronia com seu comparsa, que estava em pé sobre um dos bancos, com os dois braços abertos como se num palco da Broadway:
- IT'S DUET TIME!!!!!!

Em seguida se lançaram numa brilhante interpretação de "Fly me to the moon", a capella. Quando terminaram, com o vagão vindo abaixo em aplausos, um deles estendeu o chapéu onde depositei 30 dólares. Mais do que o relógio valia.

Nenhum comentário: